Neste mês iniciamos uma sequência de textos acerca dos impactos do descarte incorreto de medicamentos e suas consequências ambientais. Hoje, no Junho Ambiental, falaremos sobre os impactos do descarte incorreto de antibióticos no solo.
De acordo com uma pesquisa feita pelo Conselho Federal de Farmácia em 2019, 76% dos entrevistados descartam os seus medicamentos irregularmente; a maioria no lixo comum. Como antibióticos são muito usados no tratamento de infecções no Brasil, pressupõe-se que a maior parte dos antimicrobianos usados são descartados incorretamente também. Essa atitude problemática e muito comum representa um alto risco de contaminação devido às diversas etapas que esses resíduos percorrem até chegarem a seus destinos finais.
Além disso, a exposição destes medicamentos por muito tempo ao ambiente, por não serem recolhidos de forma ou no tempo adequado, leva à possibilidade de os antibióticos serem manuseados por outras pessoas, como catadores de lixo. Ainda, podem ser consumidos por animais de rua que mexem nos lixos à procura de alimento. Somado a isto, segundo a Associação Brasileira de Empresas de Limpeza Pública e Resíduos Especiais (Abrelpe), 18% de todos os resíduos do país são depositados em locais sem nenhum controle ambiental e sanitário - os lixões - colocando em risco o meio ambiente e a saúde pública.
Como consequência, as bactérias presentes naturalmente nos lixões, e em outros ambientes, podem entrar em contato com os antibióticos descartados incorretamente. Dessa forma, há um aumento da taxa de mutação no material genético bacteriano, o que torna viável a manutenção de diversas espécies de bactérias resistentes a diferentes antibióticos. Além disso, devido às características físico-químicas dessas substâncias, e ao fato de a mobilidade do solo ser baixa, a sua constante acumulação pode torná-las poluentes persistentes e difíceis de serem eliminadas.
A presença de antibióticos no solo afeta também a atividade de enzimas bacterianas e altera a estrutura da comunidade microbiana. Diversos microrganismos já estão naturalmente presentes neste ambiente e são considerados indicadores importantes do solo. Com a presença antibióticos, ocorre a eliminação de diversas populações.
Os impactos dessa exposição aos antibióticos afetam não só os microrganismos, mas também organismos superiores. A presença de antibióticos - principalmente a longo prazo - pode levar ao acúmulo desses nas populações humanas e animais, com consequências concretas ainda desconhecidas.
Como resultado da degradação dos resíduos presentes no lixo e expostos no ambiente e das águas das chuvas, forma-se um líquido escuro com odor desagradável, altamente tóxico e forte, o chorume. Esse líquido infiltra-se no solo, juntamente com os resquícios dos antibióticos ali descartados, podendo atingir os lençóis freáticos e contaminar as águas subterrâneas, como já comentamos no texto “Junho Ambiental: O impacto dos antibióticos na água”.
No caso dos aterros controlados, há uma técnica de destino dos resíduos que diminui os impactos ambientais: o chorume penetra e contamina o solo, porém em menor proporção que os lixões. Nos aterros sanitários, além de realizarem o destino adequado, também fazem o tratamento dos resíduos; o chorume é canalizado, coletado e encaminhado para um tanque de tratamento. No entanto, não há tecnologia suficiente para remover os compostos químicos, assim como com as estações de tratamento do esgoto. Como consequência, ocorre a liberação de resquícios de medicamentos nos efluentes tratados pela estação de tratamento de chorume, causando a contaminação do ambiente pelo efluente já tratado. Por isso, a incineração feita em unidades especializadas é, por enquanto, a única capaz de degradar as substâncias químicas e reduzir o antibiótico à sua mínima fração, diminuindo a contaminação do ambiente.
Por fim, a principal causa da intensificação da resistência aos antimicrobianos continua sendo o uso indiscriminado dos mesmos nas terapias humanas. Em relação aos lixões, é necessária a orientação da população por parte dos poderes públicos acerca das consequências dos impactos do descarte de antibióticos nos lixos comuns. Ademais, também é necessário um maior investimento para tecnologias de remoção completa das substâncias químicas em aterros sanitários e para criação de mais unidades de tratamento. Já os antibióticos, devem ser retornados aos pontos de coletas, como as farmácias, para que os impactos no meio ambiente sejam minimizados.
Referências: http://www.crfsp.org.br/noticias/10535-pesquisa-aponta-que-77-dos-brasileiros-t%C3%AAm-o-h%C3%A1bito-de-se-automedicar.html https://www.mma.gov.br/estruturas/secex_consumo/_arquivos/8%20-%20mcs_lixo.pdf https://core.ac.uk/download/pdf/159769465.pdf https://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0037-86822009000400011&lng=pt&nrm=iso https://agenciabrasil.ebc.com.br/geral/noticia/2018-09/lixoes-continuam-crescer-no-brasil-mostra-levantamento#:~:text=A%20destina%C3%A7%C3%A3o%20correta%20do%20lixo,22%2C9%25%20dos%20res%C3%ADduos. https://www.ncbi.nlm.nih.gov/pmc/articles/PMC6616856/