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Junho Ambiental: Infecções hospitalares e bactérias multirresistentes


Como vocês já têm acompanhado, em comemoração ao Dia Mundial do Meio Ambiente (05 de junho), iniciamos uma série de textos: Junho Ambiental. Vimos discutindo, em nossas postagens, os diversos níveis afetados pelo uso irracional de antibióticos e, dentre os ecossistemas e ambientes extremamente afetados, temos os hospitais, onde há grande incidência de bactérias multirresistentes. Hoje, abordaremos esta correlação.

Em primeiro lugar, a resistência bacteriana é a capacidade das bactérias de permanecerem vivas e se multiplicando, mesmo sob a ação de medicamentos contra elas, os antibióticos. Os mecanismos de resistência são um fenômeno natural; diversos antibióticos de uso clínico, hoje, foram descobertos em bactérias e fungos. Entretanto, o uso excessivo de antibióticos pelo homem criou uma pressão seletiva artificial, levando ao aumento e persistência das bactérias resistentes; com isso, as trocas genéticas entre as bactérias acabaram favorecendo a transferência destes genes de resistência de uma forma mais eficaz e rápida. Como consequência, muitos tratamentos se tornam ineficazes, aumentando risco e número de mortes.

Em segundo lugar, é importante destacar que o Fórum Econômico Mundial classifica a resistência aos antibióticos como um problema de saúde mundial desde 2013. Hoje esse problema já é visto como uma crise sanitária e, possivelmente, tornar-se-á uma crise financeira. Com isso, países subdesenvolvidos poderão sofrer os piores impactos econômicos caso, até 2050, nada seja feito em relação às bactérias multirresistentes. Além disso, a velocidade com que as bactérias adquirem resistência, hoje em dia, é incompatível tanto com o processo da pesquisa sobre novos antibióticos, quanto todo o processo até ele ser vendido.

Nessa perspectiva e sob o contexto de pandemia mundial, deve-se evidenciar a correlação entre as superbactérias — aquelas que resistem a diversas terapias farmacológicas — e o meio hospitalar. De acordo com estudos recentes, 75% das bactérias resistentes estão presentes no ambiente hospitalar e podem causar doenças. Além disso, 40% dessas possuem resistência aos antimicrobianos de última escolha em tratamentos; ou seja, se não puder ser utilizado no combate à doença, restam pouquíssimas ou nenhuma opção terapêutica. De acordo com estudos, é preocupante o declínio dos investimentos e a falta de inovação no desenvolvimento de novos antibióticos, o que prejudica os esforços para combater infecções resistentes.

Durante a pandemia da COVID-19, a terapia com antibióticos aumentou consideravelmente em função da ausência de informação concreta a respeito dessa doença. Com a incerteza do diagnóstico, muitas vezes, não é possível excluir uma infecção bacteriana como hipótese durante o quadro infeccioso do coronavírus humano. De acordo com a OMS, apenas uma pequena parcela dos pacientes com COVID-19 precisa, de fato, fazer uso dos antibióticos para tratar infecções bacterianas. Essa instituição, inclusive, publicou orientações aos serviços médicos para não fornecerem tratamento com antibióticos aos infectados que apresentem apenas os sintomas leves, com suspeita ou com a confirmação da COVID-19 moderada, a menos que haja uma necessidade clínica para fazê-lo. Essa orientação possui grande relevância, pois mais de 70% dos pacientes recebem terapia antimicrobiana, apesar de menos de 10% ter apresentado infecção secundária por bactérias.

Junto a isso, há também uma precarização da assistência hospitalar devido à superlotação dos leitos, diminuição de equipamentos de proteção individual (EPI), hospitalização prolongada com uso de procedimentos invasivos e diminuição no número de profissionais de saúde devido à doença. Essa crise decorrente da falta de investimentos na saúde pública, e sua intensificação durante a pandemia mundial, fazem com que o profissional de saúde dificilmente consiga se higienizar de forma adequada durante o tratamento dos pacientes. Esses, por sua vez, tornam-se um possível veículo de transmissão dessas superbactérias durante o processo de assistência hospitalar. Todos esses fatores correlacionados com a COVID-19 permitem dizer que essa pandemia impulsionará ainda mais a seleção artificial e transmissão de microrganismos resistentes e multirresistentes.

Com a pandemia há uma grande quantidade de pacientes em hospitais que necessitam de procedimentos invasivos, como a intubação para ventilação mecânica, os quais favorecem a transmissão desses microrganismos entre o meio hospitalar e as pessoas que nele estão. Nessa perspectiva, a Comissão de Controle de Infecção Hospitalar (CCIH) e o Serviço de Controle de Infecção Hospitalar (SCIH) são responsáveis por tentar prevenir o maior número de infecções relacionadas à assistência à saúde (IRAS) evitáveis. Já para as IRAS inevitáveis, eles possuem o papel de diagnosticar rapidamente e implementar o tratamento mais adequado. Para isso, as CCIH realizam práticas de controle, como a vigilância epidemiológica, criação de protocolos de precauções padrão e de contato, e gerenciam o uso de antibióticos para garantir o uso correto. Contudo, diante da grande desordem que tem ocorrido devido aos casos de COVID-19 e a crise sanitária, esses setores não estão conseguindo remediar, ou mesmo realizar a vigilância na mesma velocidade do surgimento de novas resistências.

Portanto, como expectativas da pandemia, podemos esperar aumento nos índices de uso e de resistência aos antibióticos.

Referências: https://www.youtube.com/watch?v=TkXXTwc2XI4&feature=youtu.be https://academic.oup.com/jac/advance-article/doi/10.1093/jac/dkaa194/5841159 https://www.bmj.com/content/bmj/369/bmj.m1983.full.pdf https://www.bio.fiocruz.br/index.php/br/noticias/1823-resistencia-a-antibioticos-e-covid-19

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